Com Talibã, projeto de formação musical no Afeganistão paralisa atividades

por Redação CONCERTO 30/08/2021

Desde o retorno do Talibã ao poder no Afeganistão, o Instituto Nacional de Música do país paralisou suas atividades. O projeto foi criado em 2010 e oferece formação musical para crianças e jovens, além de manter cinco grupos musicais.

O Talibã retomou o poder no Afeganistão há cerca de duas semanas. Prometeu discurso mais moderado, mas declarações recentes indicam que a política com relação a atividades musicais deverá ser a mesma do período entre 1996 e 2001, quando o grupo esteve no poder no país e baniu a prática musical em todo o país.

Um porta-voz do Talibã, Zabihullah Mujahid, cotado para assumir o Ministério da Informação e Cultura, afirmou na semana passada: “A música é proibida pelo Islã. Mas esperamos sermos capazes de persuadir as pessoas a não se envolverem neste tipo de prática, em vez de pressioná-las”.

Criador do Instituto Nacional de Música, Ahmad Sarmast, que estava em viagem pela Austrália quando houve a tomada de Cabul, afirmou à BBC que pediu que os jovens músicos e professores da entidade fiquem em casa, em especial os da Orquestra Zohra, formada apenas por mulheres. 

“Todo o instituto parou de funcionar. Não há nenhuma informação sobre se poderemos reabrir ou não e se a segurança de nossos jovens estará garantida. Nossos professores estão em casa ou escondidos, e o mesmo acontece com os alunos”, disse.

Jovem musicista da Orquestra Zohra, composta apenas por meninas afegãs [Divulgação/Site Instituto Nacional de Música do Afeganistão]
Jovem musicista da Orquestra Zohra, composta apenas por meninas afegãs [Divulgação/Site Instituto Nacional de Música do Afeganistão]

O prognóstico não é dos melhores. Em 2014, Sarmast foi alvo de um atentado a bomba, no qual perdeu parte da audição em um ouvido. Na época, o Talibã reivindicou autoria do ataque e acusou o professor de corromper a juventude afegã.

“Nos anos 1990, a atitude perante qualquer música que não os cânticos religiosos fez com que pessoas fossem presas e precisassem esconder seus instrumentos, tocando apenas em segredo. Eu não seria otimista sobre o futuro”, afirmou ao New York Times o professor William Maley, da Universidade Nacional da Austrália, que estuda a cultura no Afeganistão.

O jornal entrevistou funcionários do instituto que, de longe, acompanham a movimentação na sede do projeto, e afirmaram que o Talibã tem feito perguntas sobre a localização de Sarmast, cuja casa também foi revistada.

 

O trabalho do Instituto Nacional de Música do Afeganistão foi pioneiro. Nele, meninos e meninas tinham aulas em conjunto, nas mesmas salas. Estudavam a música ocidental e também a música afegã. Órfãos e crianças que viviam na rua eram convidados a participar das aulas. Em muitos casos, os formados no instituto eram os primeiros em suas famílias a obter um diploma. 

O instituto mantém a Orquestra Sinfônica Nacional, a Orquestra de Mulheres Zohra, formada apenas por musicistas e comandadas geralmente pelas alunas de regência, a Orquestra Jovem Afegã, um coro e uma orquestra profissional e outra acadêmica dedicadas à música afegã. Além das aulas de música, eram oferecidas aulas de matemática, ciência, física, ciências sociais e Estudos Islâmicos e diversos idiomas. 

“Nossos alunos estão com medo. Eles não se sentem seguros. Este é um momento de devastação dos nossos sonhos, esperanças, da possibilidade de futuro”, disse Armast à BBC. “E é preciso que a comunidade musical internacional demonstre sua solidariedade com a música e os músicos do Afeganistão.”

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Orquestra do Instituto Nacional de Música do Afeganistão [Divulgação/Site Instituto Nacional de Música do Afeganistão]
Orquestra do Instituto Nacional de Música do Afeganistão [Divulgação/Site Instituto Nacional de Música do Afeganistão]

 

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