#ÓperaHoje: Para gestores e maestros, pandemia deve ser momento de aprendizado

por Redação CONCERTO 17/10/2020

Na noite de quinta-feira, dia 15, o webinário #ÓperaHoje reuniu representantes de cinco importantes teatros brasileiros para debater um tema central: Teatros e Orquestras em Tempos de Pandemia. Na pauta, as ações criadas nesse momento – e as expectativas de lições para o futuro.

Participaram Aldo Mussi, presidente da Fundação Theatro Municipal do Rio de Janeiro; Jena Vieira, diretora do Festival do Theatro da Paz; Luciana Salles, diretora artística da Fundação Clóvis Salgado; Luiz Fernando Malheiro, diretor artístico do Festival Amazonas; e Roberto Minczuk, regente titular da Orquestra Sinfônica Municipal do Theatro Municipal de São Paulo. A mediação foi do compositor João Guilherme Ripper, diretor da Sala Cecília Meireles.

Aldo Mussi acredita que a “crise provocou a criatividade, com todos se envolvendo”. O Theatro Municipal do Rio de Janeiro criou séries de conversas, aulas pela internet, e investiu na recuperação dos acervos históricos da casa, revisitando as temporadas líricas desde 1910. “Além disso, criamos a Série Nepomuceno em casa, com cantores interpretando canções do compositor com Priscila Bonfim. Ou a Série Margens, com novas coreografias preparadas pelos nossos bailarinos.”

Em Belém, Jena Vieira conta que, em março, às vésperas da estreia da primeira produção do festival, foi preciso começar do zero. “Ou cancelávamos tudo ou nos reinventávamos. E foi o que fizemos, colocando o foco na formação, com dezesseis oficinas e um ciclo de dezesseis webinários discutindo a ópera. No ano passado, tivemos 20 bolsas para cantores e 20 para técnicos. E, este ano, com a pandemia, o governo teve a sensibilidade e nos deu a chance de dobrar o número de bolsas.” Il Tabarro, a ópera prevista para abril, foi remarcada para dezembro, mas ainda não há como saber se isso se dará com público no teatro ou apenas com transmissão.

Luciana Salles, do Palácio das Artes, ressaltou a necessidade de “começar tudo outra vez”. “Como para todos, a primeira coisa foi o susto. Tínhamos um ano todo montado, a comemoração dos cinquenta anos. Após o susto, criamos o Palácio em sua Companhia, migrando do palco para a tela. Como nosso acervo de pessoas é muito rico, a orquestra, o coral lírico, a companhia de dança, o Cefart, nossas galerias de arte e o Cine Humberto Mauro, tínhamos a capacidade de produzir muito material interno.”

Para ela, há alguns aspectos positivos, como a diversidade de público que foi possível alcançar pela internet, catalisando uma mudança. “E começamos a tentar a recuperar projetos pensados inicialmente, como a temporada de ópera, com essas discussões, a academia de ópera, exposição, mostra de cinema. Um conteúdo que acreditamos que vai fazer diferença no meio. E seguimos na preparação dos protocolos sanitários, adaptando o trabalho do Fórum com as determinações do governo e da prefeitura. Em breve abriremos as galerias de arte, mas ainda não sabemos quando isso vai acontecer com os teatros. Mas seguimos remanejando as agendas, conversando com os produtores, compreendendo o momento deles também, tentando nos adaptar ao momento. E aceitando que é um momento que veio para ficar. O digital, mesmo com o retorno do presencial, veio para ficar, e vamos ter que pensar em novos formatos.” 

“O Festival de Ópera estava em fase final de preparação, com algumas produções já sendo erguidas, e da noite para o dia foi preciso parar tudo, o que naturalmente foi bastante traumático”, contou Luiz Fernando Malheiro. Com o tempo, os corpos artísticos do Teatro Amazonas foram se reinventando e encontrando espaço digital para apresentações e aulas. “Com relação ao festival de ópera, eu me deparei, nas conversas e lives, com a enorme quantidade de novos compositores brasileiros com carência de espaço. Esse é um problema histórico, vem de séculos. Então buscamos autores jovens interessados em trabalhar com ópera. E resolvemos criar um festival on-line com esse perfil. Encomendamos três óperas e uma série de peças para voz e instrumentos a diversos compositores, além de recuperar outras que estavam engavetadas. A orquestra está gravando no palco, cantores em outras cidades, a parte de vídeo também dividida. É um desafio, mas está se revelando um processo interessante. E teremos, no palco, uma série de recitais de canto e piano dedicados também a brasileiros.” Os corpos estáveis do Amazonas seguem realizando série de câmara no palco, com exceção do coral. “Isso tem dado protagonismo aos artistas e nos permitido conhecê-los melhor.”

Roberto Minczuk relembrou a perda, no início da pandemia, da maestrina Naomi Munakata, diretora do Coral Paulistano, corpo estável do Theatro Municipal de São Paulo, vítima do coronavírus. “Foi algo muito real para nós a doença, desde o início. É algo real, trágico. E que mexeu com a vida dos artistas, com os trabalhadores da arte”, disse. Ele ressaltou também o que chamou de “um estado de confusão”. “Vemos os aviões cheios e não entendo por que uma sala de concertos, muito mais ventilada, não poder retomar as atividades artísticas, obviamente que com todos os cuidados necessário. Infelizmente não somos considerados atividade essenciais, e cabe a nós mostrar como somos importantes para as pessoas. Precisamos fazer esse discurso incansavelmente.”

Ele lembrou de alguns destaques da temporada que estava prevista, como a ideia da produção de Fidelio, de Beethoven, ao ar livre, no Carandiru, e o double bill de óperas baseadas em Plínio Marcos, com Navalhe na carne, de Leonardo Martinelli, e Homens de Papel, de Elodie Bouny, que serão retomadas na semana que vem. Segundo ele, o Municipal retomou atividades na última sexta-feira, com objetivo de fazer transmissões e gravações. “Tenho insistido para que o teatro possa investir na tecnologia para que, quando voltarmos, o trabalho digital possa continuar. Ter essa capacidade é fundamental.”

Debate do webinar #ÓperaHoje - mesa gestores

João Guilherme Ripper colocou a todos uma questão. “Estão aqui os cinco principais teatros brasileiros de ópera aqui representados. Todos têm missões artísticas semelhantes, difundir a ópera. Mas, diante da pandemia, essa missão fica prejudicada. Vocês entraram em campo para vencer essa barreira. Mas a pergunta que fica é: qual a missão do teatro de ópera em uma pandemia como essa?”

“Estamos diante de uma situação de pandemia mundial. Nenhuma pessoa já experimentou o que vivemos nesse momento. Diante disso, estamos fazendo o que precisamos fazer, ou seja, refletir, debater os rumos da ópera, pensar no futuro. E isso está sendo possível porque criamos um fórum para debates. Repensar o que fizemos até agora e o que pode ser feito”, respondeu Luciana Salles. “Precisamos criar maneiras da produção acontecer ainda nesse contexto de pandemia, se não no palco, pensando no mercado, em capacitação, olhando para o mercado.”

“Das artes performáticas, a ópera é a que mais emprega, mas também desempregamos muito com a pandemia. Se os gestores entenderem o impacto da ópera, nunca vai se pensar em parar a ópera. Graças a Deus temos uma secretária, Úrsula Vidal, que se preocupou demais com isso. A ópera não pode parar, temos muitos teatros em todo o Brasil, precisamos trabalhar com esses teatros. A pandemia nos ensinou a nos conectar mais e nos dar esse alento de que podemos investir na formação”, colocou Jena Vieira.

Malheiro chamou atenção para a necessidade, por parte dos fóruns, “de ensinar às pessoas e à classe política que a ópera não é elitista, pode e deve ser acessível". "Fiquei impressionado com os concurso on-line de canto, com 250 cantores inscritos. A quantidade de pessoas é impressionante, e precisamos investir demais em artistas brasileiros”, disse Malheiro.

“Vamos ter que ser muito criativos. Outro dia assisti um filme no drive-in e fiquei encantado. E, se a gente tiver um palco com uma tela, podemos fazer ópera no mesmo formato. Mas isso exige investimento e patrocínio. Dá para fazer ópera ao ar livre. Por que não pensar em parcerias com serviços de streaming, como Netflix, Amazon Prime, para transmitir nossas produções?" Para Mussi, o setor tem mesmo que invadir serviços como esses e buscar novos caminhos e invadir novos espaços. “A hora é agora, pegar a pandemia e transformar em benefícios para o mundo da ópera”, disse. E Ripper lembrou que as transmissões podem significar um alcance geográfico maior. 

Assista abaixo ao vídeo completo da mesa.

#ÓperaHoje – Mesa 5 – Teatros e orquestras em tempos de pandemia
Mediação: João Guilherme Ripper (RJ). Convidados: Aldo Mussi (RJ, TMRJ), Jena Vieira (PA, Theatro da Paz), Luciana Salles (MG, Palácio das Artes), Luiz Malheiro (AM, Festival Amazonas de Ópera) e Roberto Minczuk (SP, TMSP)

 

Confira a cobertura especial da Temporada de Óperas on-line da Fundação Clóvis Salgado.

Curtir

Comentários

Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da Revista CONCERTO.

É preciso estar logado para comentar. Clique aqui para fazer seu login gratuito.