Dança na internet: a potência da arte na rede que abraça o mundo

por Redação CONCERTO 14/11/2023

Por Keyla Barros [jornalista formada pela Universidade Tuiuti do Paraná, atua na área desde 1997. Em 2010, lançou o portal de notícias Dança em Pauta com a proposta de empregar seu conhecimento em comunicação para divulgar a dança]

Em 2010, envolta em minha recente paixão pelo universo da dança, decidi empregar meus conhecimentos em comunicação para lançar o portal de notícias Dança em Pauta, um veículo de comunicação jornalístico, voltado para a divulgação desta arte. Ao lado de uma colega designer, iniciei uma pesquisa para avaliar o que já existia na internet sobre dança. Como profissionais de comunicação vimos um grande potencial neste nicho, tanto pela infinidade de assuntos a serem abordados, quanto pela possibilidade estética, uma vez que a dança proporciona belíssimas imagens. Por isso mesmo, nos surpreendeu constatar que existia pouco conteúdo especializado, a maioria blogs feitos por profissionais de dança muito bem-intencionados, mas sem conhecimento das ferramentas de comunicação, tanto no que diz respeito a escrita quanto ao layout. Desta pesquisa feita na época, destaco aqui o site Conectdance, lançado em 2009, pela jornalista, crítica, curadora e produtora de eventos na área de dança Ana Francisca Ponzio, que segue divulgando a dança até hoje.

De lá pra cá, em pouco mais de uma década, muita coisa mudou. De 2012 a 2015, as jornalistas Marcela Benvegnu e Flávia Fontes editaram a Revista de Dança, um site que apresentava um layout com cara de revista e matérias escritas por jornalistas especializados e profissionais de dança de várias regiões do país. Ainda em 2012, o bailarino Tarcísio Cunha lançou o Agenda de Dança, site voltado à divulgação de espetáculos e eventos de dança pelo Brasil. Em 2014, as produtoras culturais Natália Gresenberg e Talita Bretas, lançaram o Museu da Dança (MUD), um acervo virtual da dança brasileira com o propósito de contar e preservar a história da dança. Com o tempo, o MUD se tornou um portal que abriga, além do museu virtual, o Laboratório da Dança, com venda de aulas online; o Mural da Dança, com oportunidades de trabalho na área; e o Calendário da Dança, com notícias sobre eventos, cursos, espetáculos, etc. 

A internet revolucionou a forma como a sociedade e os indivíduos se comunicam e o impacto da pandemia colocou em velocidade exponencial as mudanças que já estavam em andamento

A internet revolucionou a forma como a sociedade e os indivíduos se comunicam e o impacto da pandemia colocou em velocidade exponencial as mudanças que já estavam em andamento. Foi preciso repensar formatos e relações de trabalho. Fazer um planejamento atualizado da comunicação, seja para um profissional ou uma empresa, um produto ou um serviço, deixou de ser uma opção e passou a ser uma necessidade em todas as áreas. A dança não ficou de fora disso. De cias profissionais a escolas e bailarinos, aqueles que aprenderam a usar a tecnologia a seu favor estão colhendo os frutos e disseminando o seu trabalho e a arte de forma geral.

Em 2020, já consolidada e com um trabalho artístico reconhecido, a São Paulo Cia de Dança (SPCD) foi uma das instituições que soube rapidamente se reestruturar para seguir presente junto ao público em meio ao isolamento social da pandemia. A cia fez transmissões de espetáculos ao vivo pelo YouTube, filmou videodanças e webseries, gravou podcasts e promoveu diversas lives nas redes socias, com bailarinos e outros profissionais da SPCD, mantendo o vínculo com a plateia já cativa e alcançando novas audiências em todo o país e no exterior sob o selo do @SPCDigital.

No mesmo período, em Curitiba (PR), o casal de artistas flamencos Jony Gonçalves e Miri Galeano, diretores da escola Perla Flamenca, foi um dos exemplos positivos de superação das restrições da pandemia que afetaram tantos negócios. A dupla pesquisou sobre as técnicas e equipamentos para videoconferências, investiu em tutoriais para aprender a montar a iluminação e melhorar o áudio e soube explorar com maestria as possibilidades da educação à distância, mergulhando no universo das videoaulas, videodanças e dos eventos online. Em pouco tempo, a falta de intimidade com as câmeras e as dúvidas de como transmitir o conhecimento de forma virtual, deram lugar a novas abordagens da arte e a oportunidade de conectar pessoas em todo o mundo. O trabalho deu tão certo que eles não apenas mantiveram a escola durante a pandemia, como mesmo com a volta das atividades presenciais, seguem oferecendo as aulas online para alunos de outras cidades e estados, assim como para estudantes de países da América do Sul e do México.

E se em 2010, alguns poucos profissionais de dança davam os primeiros passos no sentido de divulgar seus trabalhos na internet, hoje, vemos muitos bailarinos e professores de dança que buscam conhecimento em comunicação digital para desenvolverem seus trabalhos com a arte. Não é difícil encontrar bailarinos estudando em cursos como jornalismo, marketing e até mesmo administração, contrariando a máxima de que “artistas não sabem gerenciar o trabalho”.

Para auxiliar este novo perfil do “artista empreendedor”, as diversas redes sociais que surgiram neste período foram fundamentais

Para auxiliar este novo perfil do “artista empreendedor”, as diversas redes sociais que surgiram neste período, como Orkut (desativado em 2014), Facebook, Twitter (atual X), Instagram, TikTok, entre outras, foram fundamentais. Uma boa divulgação nestes meios pode garantir no mínimo mais alunos e convites para ministrar aulas em eventos. E se a sorte soprar e um vídeo viralizar, o profissional pode conquistar uma legião de seguidores, trazendo com eles contratos de publicidade. 

É o caso da brasileira Lurdiana Tejas, bailarina de dança do ventre que, em 2021, do dia para a noite, virou celebridade no Egito. Um vídeo despretensioso, em que ela dançava sem figurino e maquiagem característicos do gênero, em um salão de beleza no Cairo, caiu nas graças dos internautas e viralizou, sendo o principal assunto por dois dias seguidos nas redes sociais do Cairo e de Dubai. O resultado foram entrevistas para TV e demais veículos de comunicação, capas de revista, convites para gravação de clipes musicais e uma agenda disputada para apresentação em eventos no Egito que trouxe um cachê à altura. Em entrevista ao programa Fantástico, da Rede Globo, ela comentou que passou a ganhar em uma apresentação o equivalente ao que faturava anteriormente em um mês de trabalho. Atualmente, sua conta no Instagram já passa dos 2 milhões de seguidores e Lurdiana é considerada uma das melhores bailarinas do país.

E quando falamos no mercado da dança na internet, impossível não citar a FitDance, empresa fundada em 2014, em Salvador (BA), pelos irmãos Fábio e Bruno Duarte, que se tornou umas das maiores plataformas de dança do mundo, com mais de um milhão de aulas aplicadas por ano em academias e mais de 10 bilhões de visualizações acumuladas na internet. A marca oferece um programa de aulas para formação de professores de dança que atuam como instrutores de suas coreografias oficiais. Além disso, possuem um canal no Youtube, com vídeos de dança e apresentações de seus professores, com mais de 16 milhões de inscritos. Em maio de 2022, a FitDance foi comprada pelo Grupo SBF, que também é proprietário de empresas como a rede de lojas Centauro, maior varejista esportiva multimarcas da América Latina; e a Fisia, distribuidora oficial da marca Nike no Brasil. 

A dança é democrática e inclusiva, além de uma atividade de autoexpressão e bem-estar, com alto engajamento digital [Gustavo Furtado]

“A dança é democrática e inclusiva, além de uma atividade de autoexpressão e bem-estar, com alto engajamento digital. Com uma proposta inovadora, fruto do senso empresarial de seus fundadores, a FitDance tem uma conexão única com os praticantes, o que a torna o maior símbolo da modalidade hoje. Para se ter uma ideia, o termo ‘FitDance’ é mais buscado do que ‘aula de dança’ no Google”, ressalta Gustavo Furtado, General Manager da SBF Ventures, responsável pela condução do negócio. 

E a influência da internet na sociedade também não passa despercebida pelos artistas, tanto que o assunto é tema de muitos espetáculos, de diferentes gêneros de dança, que buscam chamar a atenção para diversos aspectos da interação virtual. Neste sentido, os bailarinos da Cia Malbart, de Curitiba, estrearam, em 2023, o espetáculo “Levallois”, que aborda a influência da tecnologia sobre o corpo humano. Em cena, a companhia propõe a construção de uma dança que está em aberto, cujos desdobramentos dependem das escolhas do público. Isso é feito por meio de um aplicativo para celular, desenvolvido especialmente para a apresentação, que permite uma participação ativa da plateia, em tempo real, definindo a direção e os rumos da narrativa dançada. O título “Levallois” refere-se à invenção da primeira ferramenta criada pela humanidade, a pedra lascada, encontrada em Levallois-Perret, na França, e como esse instrumento influenciou as incontáveis invenções e modificações na natureza que culminaram no mundo contemporâneo.

E é assim, desbravando novas oportunidades, assimilando as vantagens da tecnologia, mas nunca deixando de questionar, que a arte da dança segue ganhando seu espaço na internet. 

PARA ASSISTIR NO STREAMING
Netflix – Série Explicando – Temporada 3 – Episódio “Danças do Momento”
Disney Plus – Série Pane Elétrica – Temporada 2 – Episódio “Reflexo”
YouTube Amálgama – O Filme, São Paulo Cia de Dança
YouTube Volver (videodança) – Perla Flamenca

Espetáculo “Levallois”, da Cia Malbart. (foto: Marcielle Monize / divulgação)
Espetáculo “Levallois”, da Cia Malbart. (Marcielle Monize / divulgação)
Cena de “Amálgama – o Filme”, da São Paulo Cia de Dança (divulgação)
Cena de “Amálgama – o Filme”, da São Paulo Cia de Dança (divulgação)
A bailarina brasileira Lurdiana Tejas, celebridade da dança do ventre no Egito (divulgação)
A bailarina brasileira Lurdiana Tejas, celebridade da dança do ventre no Egito (divulgação)

 

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