Aos 11 anos, a compositora Dobrinka Tabakova chegou a Londres – e as coisas começaram a acontecer de maneira veriginosa. Ela entrou para a Royal Academy of Music e, dois anos depois, venceu o Prêmio Jean-Frédéric Perrenoud em Viena, ao qual concorreu com uma peça para violino e piano, Prayer. Tocar piano e compor foram atividades que nasceram em conjunto, e ela, desde a adolescência, nunca as separou. Da Royal Academy, ela seguiu para a Guildhall School of Music and Drama, também na capital inglesa. Fez seu doutorado no King’s College. E as encomendas começaram a chegar: concertos para viola, violoncelo, piano, muita música para piano, duos, trios, septetos, uma residência com a Hallé Orchestra.
Mas para compreender a música da compositora, é preciso voltar à sua infância em sua Bulgária natal. Filha de pais cientistas e acadêmicos, ela nasceu em 1980 e passou a infância em Plovdiv, segunda maior cidade búlgara, com 300 mil habitantes, às margens do rio Maritsa, cuja história remonta à Grécia Antiga e a batalhas entre sérvios e otomanos no século XIV. E essa história, ou o modo como Tabakova a absorveu, foi determinante em sua personalidade musical.
“Eu diria que a melodia é muito importante para mim. Gosto de escrever melodias, encontrar e criar melodias... algo que tenha algum tipo de linha, algo que te leve de um lugar para outro. Eu diria que melodias são uma das principais coisas em que penso, mas também penso em termos de camadas. Eu nasci e crescei em uma cidade que tem cerca de 8 mil anos, então eu sempre penso, e estou muito ciente disso, nas camadas de diferentes civilizações, nas camadas que cada civilização deixou e sobre como nós construímos sobre isso, sugerindo um novo começo e então uma nova camada. Essas camadas estão de alguma forma inseridas no meu modo de pensar e também na minha música”, ela contou em uma entrevista de 2020.
Essa relação com o mundo à sua volta – com o processo histórico que não deixa de ser construído – aparece frequentemente em suas considerações sobre o ato de compor, ao qual atribui enorme responsabilidade. Diz ela, na mesma entrevista. “O silêncio é o começo da música e está repleto de possibilidades. Há nele uma sensação de antecipação, expectativa, mas também enorme respeito. Acredito nisso, porque você precisa ter algo a dizer para quebrar este silêncio. É, de certa maneira, uma forma de respeito ao mundo à sua volta.”
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A Earth Suite é símbolo desse olhar sensível para o mundo. É uma obra em construção – hoje, tem três movimentos, mas Tabakova não descarta acrescentar outros nos próximos anos, da mesma forma como afirma que as partes podem ser executadas em conjunto ou individualmente, sem as demais.A natureza está por trás da inspiração de Tabakova. “Sua força avassaladora é o centro da suíte. “A questão da nossa existência como espécie está se tornando cada vez mais complexa, e ainda assim o poder supremo continua com a natureza. Essas são contemplações que explorei em vários trabalhos anteriores, incluindo meu concerto para violino, The Patience of Trees, e em inúmeras obras inspiradas em montanhas”, ela explica em texto sobre a obra.
Tectonic, o primeiro movimento, explora musicalmente as consequências do movimento das placas tectônicas. Tabakova diz que a peça é “vertical em seu conceito”, caracterizada por caracterizado por blocos e saltos na música. Pacific vai em outra direção: evoca “a calma do maior oceano da Terra, estendendo-se lentamente até um horizonte infinito”.
E Timber and Steel? “Comemorando os 150 anos do nascimento do fundador do festival Proms, Henry Wood, o título da peça inclui o apelido pelo qual essa figura tão amada da música britânica era conhecida entre os frequentadores e músicos do Proms: timber. Enquanto eu contemplava o que Henry Wood teria pensado a respeito do mundo de hoje, eu me peguei pensando no mundo que ele testemunhou no final dos anos 1860”, ela expliva. “Então mergulhei no período da grande industrialização pela qual foi marcado o século XIX que precedeu o nascimento de Wood. As máquinas nos deram mais tempo, permitindo que as pessoas investissem em aprender sobre o mundo, educando-se e aproveitando atividades culturais.”
Segundo Tabakova, o objetivo ao escrever esse movimento foi “criar uma sensação de impulso, movimento e progresso”. “Afinal, vimos os avanços mais surpreendentes em tecnologia no último século, e essa energia implacável é o que motivou meu trabalho. O título também faz alusão aos elementos fundadores da industrialização e tem uma conexão com os materiais encontrados mais amplamente entre os próprios instrumentos orquestrais: madeiras e metais. Esses dois mundos sonoros estão constantemente sendo colocados um contra o outro, começando com as marimbas amadeiradas que formam a base para as faíscas de metais. Uma série de “células” musicais se encaixam ao longo da peça”, completa a compositora.
![A compositora Dobrinka Tabakova [Divulgação]](/sites/default/files/inline-images/w-dobrinka_tabacova_Pressphoto3.jpg)
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