Conferência aborda importância do levantamento de dados para teatros e instituições

por Redação CONCERTO 20/05/2023

MANAUS - A primeira mesa de sexta, 19, segundo dia da 16ª Conferência Anual da Ópera Latinoamérica, que está sendo realizada na capital amazonense, discutiu a inovação na gestão de espaços para as artes cênicas, tema que se desdobrou em múltiplas leituras.

Catalina Tejera, da IE University, da Espanha, falou sobre como a tecnologia está criando novos conteúdos e canais para a ópera. Isso, para ela, leva a uma reflexão sobre qual a missão dos teatros e como se dá sua comunicação com o público. 

“É particularmente importante que os teatros entendam o valor dos recursos à sua disposição”, disse. “A tecnologia é uma oportunidade por nos dar a possibilidade de conhecer nosso público e saber mais sobre ele. E é importante tomar decisões baseadas nos dados.  Reinventar o espaço físico pela tecnologia, criar espaços mais contemporâneos e novas formas de conexão com o público. A experiência artística pode desenvolver o potencial criativo dos cidadãos, em um momento em que isso é muito importante. A tecnologia é um local de encontro.”

Igor Lozada, da Universidade de Guadalajara, no México, recorreu ao estudo Culture Track, feito com mais de quatro mil pessoas ao longo de dez anos, tendo em vista o comportamento do público nos Estados Unidos. Uma pergunta era: quais as barreiras para sua participação em atividades culturais? As respostas: não é para alguém como eu; não pensei nisso; é inconveniente; não encontrei ninguém para ir comigo; não vale o custo. “Isso nos fez pensar sobre o público, o que medimos e o que não medimos sobre a relação com o nosso público”, explicou Lozada.

Para ele, essa percepção levou à noção de que os teatros não podem ser colecionadores de eventos, mas espaço de trabalho com a comunidade. Lozada apresentou, então, uma noção ligada à rentabilidade. Não se pode mais pensar na rentabilidade, ele diz, como apenas financeira, mas também falar em uma “rentabilidade social”.

Ricardo Levisky, do Festival Amazonas de Ópera e da Levisky Legado, falou sobre a corresponsabilidade no financiamento da cultura, entre governos, sociedade civil e a iniciativa privada. Nesse contexto, tocou em um tema caro a seu trabalho: o endownment, ou seja, um instrumento financeiro cujos dividendos sustentam uma entidade, conceito ligado a uma captação de longo prazo, complementando as estratégias de curto prazo. No ano passado, o Festival Amazonas criou, sob sua orientação, um fundo de reservas para começar a apontar nessa direção.

David Lomeli, da Ópera de Santa Fé, nos Estados Unidos, e da consultoria Bolero, falou da experiência de explorar maneiras mais eficientes de se investir na comunicação em mídias sociais. Ele deu como exemplo a campanha de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. No auge da disputa, sua imagem aparecia de 15 a 25 vezes por dia para o cidadão médio americano em suas redes sociais. “Quando aplicamos essa metodologia no nosso trabalho, aumentamos nosso público em 37%. E isso significou mais dinheiro e novos voos artísticos para a companhia”, explicou. Nesse sentido, Lozada trouxe outro dado: 90% da interação do público com projetos se dá pelo celular. “Como podemos nos inserir nisso, que tipo de conteúdo estamos criando para o smartphone?”

Trinidad Zaldivar, do BID, ressaltou então que é preciso investir em departamentos de comunicação e desenvolvimento institucional. E na capacidade de coletar dados que ajudem na criação de estratégias de comunicação.

Este foi, de certa forma, o tema da mesa seguinte. O primeiro a falar foi Ferran López, da consultora Teknecultura, da Espanha. “Os dados são úteis porque não são o que queremos, nos apresentam contextos reais. E não podemos melhorar o que não conhecemos”, disse. “E temos que saber o que fazer com os dados. Dados sempre existiram e nos últimos dez anos tem crescido a sua quantidade. Isso leva a uma angústia. Como usá-los? O ponto de partida é saber que perguntas eu me faço.”

Debate durante a 16ª Conferência Anual da Ópera Latinoamérica [Revista CONCERTO]
Painel de encerramento da 16ª Conferência Anual da Ópera Latinoamérica, com Augusto Techera, administrador artístico do Teatro Colón, Carmen Gloria Larenas, diretora executiva do Teatro Municipal de Santiago de Chile, Andrés Rodriguez, vice-presidente da Ópera Latinoamérica, Flavia Furtado, diretora executiva do Festival Amazonas de Ópera, Alejandra Martí, diretora executiva da Ópera Latinoamérica, e Ramiro Osorio, diretor do Teatro Major Julio Mario Santo Domingo, da Colômbia [Revista CONCERTO]

Isidora Cabezón, do Centro para a Revolução Tecnológica nas Indústrias Criativas do Chile, falou em seguida. O centro é resultado de uma política pública, com centros focados em temas específicos. Ele atua em formação, bolsas de trabalho e projetos, para “fortalecer um ecossistema tecnocriativo”, explicou.

“Os dados servem para gerar políticas públicas, medir conquistas, objetivos e impacto e tomar decisões de gestão”, diz. Em outras palavras, um setor artístico precisa saber comunicar ao governo seu tamanho, o dinheiro que movimenta, como se coloca no mercado, seu impacto econômico, para gerar políticas específicas.

Eduardo Saron, presidente da Fundação Itaú, falou em seguida. “Nós precisamos dar a devida dimensão a esse universo e oferecer evidências, pesquisas e dados para que o conjunto da sociedade, os governos e as empresas, e não apenas o mundo da economia criativa, possam ter noção da força e do poder transformador do que fazemos”, explica.

Ele lembrou pesquisa segundo a qual 60% dos trabalhadores brasileiros correm o risco de perder o emprego para a automação. A economia criativa, nesse sentido, é um dos campos mais promissores para os jovens em termos de carreira. 

Saron também mostrou alguns números sobre o setor no Brasil, como a quantidade de empresas, os tipos de contrato de trabalho e o fato de que ele representa 3,11% do PIB da economia brasileira (número maior que o da União Europeia, por exemplo). E mostrou como homens ganham 69% a mais do que as mulheres e brancos, 64% a mais que negros. “Dados são base para o desenvolvimento de qualquer política pública.”

A economia da cultura e as indústrias criativas são muito maiores que os 3,11%. A capacidade de medir a fundo e entender o tamanho do impacto entre outras indústrias, como o turismo ou a gastronomia, ainda precisa ser refinada. É um número expressivo, mas pode ser ainda maior.” 

Durante a conferência, o consultor de projetos culturais uruguaio Gonzalo Halty apresentou o livro que está produzindo – com edição da OLA em parceria com o Teatro Sodre, do Uruguai –, que leva o título “A gestão dos grandes teatros iberoamericanos”. Halty compilou 14 teatros da região que forneceram as mais diversas informações desde tamanho até programação e o modelo de gestão. A publicação inclui dois teatros do Brasil, o Teatro Amazonas e o Theatro Municipal de São Paulo.

No fim do dia, a mesa de encerramento reuniu sobre o palco Augusto Techera, administrador artístico do Teatro Colón, Carmen Gloria Larenas, diretora executiva do Teatro Municipal de Santiago de Chile, Andrés Rodriguez, vice-presidente da Ópera Latinoamérica, Flavia Furtado, diretora executiva do Festival Amazonas de Ópera, Alejandra Martí, diretora executiva da Ópera Latinoamérica, e Ramiro Osorio, diretor do Teatro Major Julio Mario Santo Domingo, da Colômbia.

[Clique aqui para ler sobre o primeiro dia da Conferência da OLA em Manaus.]

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Debate durante a 16ª Conferência Anual da Ópera Latinoamérica [Revista CONCERTO]
Debate durante a 16ª Conferência Anual da Ópera Latinoamérica [Revista CONCERTO]

 

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