Maestrina brasileira Natália Larangeira é nova regente assistente da Filarmônica de Buenos Aires

por João Luiz Sampaio 01/03/2020

A mensagem chegou logo antes do Carnaval. Trazia uma informação – e uma proposta de mudança gigantesca. Natália Larangeira havia sido escolhida para o posto de regente assistente da Filarmônica de Buenos Aires, corpo estável do Teatro Colón. E, se aceitasse, deveria se apresentar à capital argentina no início de março.

“Foi uma surpresa”, ela conta. “Eu conhecia alguns dos regentes que participaram do concurso, colegas com carreiras internacionais já. Eu na verdade fui participar despretensiosamente.” Nas provas, realizadas em meados de fevereiro, ela trabalhou com a orquestra, que tem como titular Enrique Arturo Diemecke, em obras de Mozart, Stravinsky, Debussy, Brahms, Ginastera. “Foi muito pouco tempo de preparação para um repertório tão variado. E, de repente, chegou a mensagem, dizendo que a temporada já começava em março, quando já deveria estar em Buenos Aires. Eu levei um susto.”

É compreensível. Na quarta-feira, ela se muda para a Argentina. “É algo grande. Mas a orquestra toca todas as semanas e entre minhas atribuições está acompanhar os ensaios, não apenas do Diemecke, mas também dos maestros convidados. Então precisarei estar lá o tempo todo. Mas conseguimos acertar alguns períodos nos quais poderei voltar ao Brasil, para cumprir alguns compromissos que já havia assumido por aqui.”

Maestrina Natália Larangeira [divulgação]
Maestrina Natália Larangeira [divulgação]

Natália nasceu em São Paulo. Seus primeiros estudos foram no Conservatório Arte Musical de Osasco. Estudou com Abel Rocha e Naomi Munakata na Faam, trabalhou com o Coral da Cidade de São Paulo. Desde 2015, atuava como regente assistente da Orquestra Sinfônica de Santo André. Este ano, regeu a Filarmônica de Minas Gerais.

Em meio a tudo isso, em 2013 ela criou um projeto de educação musical em Indaiatuba, no interior de São Paulo, que está muito ligado à maneira como ela compreende a função de uma regente em nosso tempo – e à sua própria trajetória como artista.

“Quando, no começo da minha carreira, trabalhei com o Coral da Cidade de São Paulo, que é formado por músicos amadores, percebi uma coisa: há muita gente que quer estar perto da música, mas não se sente permitida a fazer isso”, ela explica. “E, quando existe uma oportunidade, a transformação é incrível. A música sugere a elas uma nova razão, uma nova ética, uma nova moral. E o maestro pode ajudar nesse processo, pode ir além da questão musical e entender a si mesmo como um líder.”

Para tanto, Natália diz ter se dado conta de que, por um lado, era preciso investir no estudo da técnica, pois só assim seria possível comunicar ideias claras. “Todos os cursos, todo aperfeiçoamento eu entendo como uma maneira de conquistar conhecimento que ganha mais sentido no momento em que posso voltar e compartilhá-lo.” Mas havia outro aspecto a ser considerado. “Eu fui estudar administração, finanças, legislação, gestão. O interior de São Paulo é um terreno muito fértil, onde se pode plantar novas iniciativas. E era esse o meu objetivo.”

Voltamos, então, ao trabalho da Associação Camerata Filarmônica de Indaiatuba. O projeto nasceu em 2013, com 35 alunos e uma orquestra de cordas, que logo passou a realizar apresentações didáticas, formando uma orquestra jovem e trabalhando com músicos iniciantes. “No ano passado, recebemos uma doação de instrumentos e fizemos uma parceria com a prefeitura, o que permitiu criar três polos de iniciação musical com crianças de a partir de 6 anos, com aulas de musicalização, um coro infantil e o ensino coletivo de cordas.” Em 2019, foram 250 crianças atendidas; e, em 2020, serão 450 alunos, divididos agora em seis polos em escolas da cidade, formando quatro orquestras infantis, uma intermediária, uma jovem e uma profissional. “A ideia é mostrar que a música também é parte da realidade desses jovens. E de suas famílias: os pais, enquanto esperam seus filhos, também cantam em um coro.”

A experiência em Indaiatuba levou Natália – que nas redes sociais compartilha sua rotina, além de mostrar ensaios e seus métodos de estudo – a formatar cursos para regentes, que em 2020 devem ganhar escopo ainda maior, com a participação de maestros como Abel Rocha e Victor Hugo Toro, diretores das orquestras municipais de Santo André e Campinas respectivamente. 

“São aulas práticas de regência aliadas a conversas sobre carreira, sobre a criação de ambientes saudáveis de trabalho, sobre o papel do maestro. E sobre como podemos multiplicar o trabalho que fazemos. Às vezes me perguntam se não temo a concorrência. De jeito nenhum. Precisamos multiplicar o trabalho. E se minha experiência tem funcionado, quero compartilhar o que fizemos para que isso leve à criação de novos projetos. Os projetos sociais formam cada vez mais músicos e precisamos de novos grupos, novas orquestras para acomodá-los”, ela diz, contando que este ano também estará em Curitiba para concertos com a Orquestra da Universidade Federal do Paraná e a para um curso dedicado especificamente a mulheres regentes. 

Para Natália, 2020 está apenas começando. 

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